quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Sabe aquela pecinha?

Me permite fazer uma previsão? Lá vai.
Se você ainda não passou por isso, com certeza vai passar. Mesmo que não seja um desenvolvedor profissional ou que faça um ou outro aplicativo sem grandes pretensões, com certeza vai passar por isso. Se for profissional da área, já deve ter passado por isso uma dezena de vezes.
Para quem está começando é uma espécie de iniciação. Faz parte do ritual.
Vai chegar o dia em que um usuário, com uma única e simples ação inesperada, vai colocar aquele seu trabalho, que você considera uma verdadeira obra-prima, completamente fora de combate.
Vai chegar o dia em que você vai desejar, com todas as suas forças, que todos os usuários de sistemas virem pó. Vai desejar do fundo da alma que eles se transformem num subproduto de nada. Vai odiá-los com todas as suas forças.
Tudo isso porque eles, os usuários, teimam em não entender a profundidade e a complexidade daquela tela que custou horas e horas de trabalho para sair do jeito que você imaginou. Eles, simples mortais, não entendem a lógica irreparável que você inseriu nos códigos e teimam em subverter a lógica, inserindo um dado de forma totalmente imprevista ou executando uma ação que ninguém em sã consciência executaria.
Certa feita um amigo, grande conhecedor das mazelas do mundo informatizado, me disse que, na opinião dele, usar um microcomputador deveria ser algo reservado apenas àqueles que tivessem uma espécie de habilitação.
Concordo. Mas a vida real é outra.
Na maioria das empresas de pequeno e médio porte não há muita preocupação com a habilidade maior ou menor de seus funcionários junto a essas terríveis – para eles, claro – máquinas. Raros são os funcionários que sabem usar a maioria dos recursos de um Word ou que saibam fazer uma planilha render tudo o que o Excel oferece.
Nem mesmo a mais cuidadosa normalização dos dados vai impedir erros de digitação.
Não faz muito tempo me deparei com uma pérola destas ao checar a tela de cadastro de um cliente. No campo destinado ao nome do cadastrado, estava escrito com todas as letras: “Nelço”.Não tem como prevenir algo assim. Simplesmente não dá para listar todos os nomes possíveis para evitar erros de digitação.
Há alguns anos, quando eu ainda me irritava com essas coisas, uma usuária me ligou dizendo que o sistema estava apresentando erros, que ela digitava a data prevista para o pagamento de um título e o sistema retornava uma data completamente estranha. Depois de alguns dias fui à sede da empresa. A moça reclamou muito e disse que o sistema não podia apresentar esse tipo de erro, que os dados tinham que estar mais consistentes, etc, etc. Ao ver a anotação do pagamento a ser feito, percebi a razão do erro: a data anotada era 30 de Fevereiro. Eu, já espumando de contentamento pelo tempo perdido e depois de ter sido obrigado a ouvir tanta reclamação, perguntei à sapiente figura: - Me diga uma coisa, Fevereiro é 30 ou 31?
Você acredita que ela ainda parou prá pensar?
Depois de chegar à brilhante conclusão que Fevereiro ia no máximo até o dia 28 (aquele ano não era bissexto), ela ainda teve a cara de pau de reclamar que o sistema tinha que ter um aviso para quando alguém entrasse com uma data absurda.
Eu respondi que sim, que era perfeitamente possível fazer, mas que eu teria que cobrar pelo serviço. Arrematei dizendo que iria sugerir à direção da empresa uma outra solução mais barata e mais eficaz: contratar uma funcionária que soubesse que o mês de Fevereiro não tem 30 dias.
Claro que não disse nada ao Diretor, mas ela foi demitida semanas depois. Uma pessoa que é capaz de cometer esse tipo de erro, tranquilamente comete outros do mesmo teor ou piores e um desses erros – ou vários deles – deve ter sido a causa da sua demissão.
A falta de preparo dos usuários é uma das razões pelas quais eu não acredito muito na eficácia de aplicativos que, por terem sido criados visando a venda massificada, exigem um certo preparo dos usuários. Numa empresa muito bem organizada e com porte suficiente para implantar uma política de qualidade na admissão de funcionários, até é possível que um aplicativo mais complexo e que exija mais do operador possa ser eficiente. O problema é que nas empresas de pequeno e médio porte não há essa preocupação – pelo menos na maioria delas. E o tempo gasto com treinamento nem sempre compensa a eventual economia que se faz com um software de baixa customização.
Essa pecinha, que nos arruma tantos problemas, é ao mesmo tempo o nosso controle de qualidade. É justamente o usuário quem vai nos dar a informação necessária para que possamos desenvolver mais e melhor, desde que, claro, saibamos ouvir seus comentários e suas reclamações.

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